Hoje, ninguém anda sem algum tipo de relógio mecânico, que mede o tempo a partir das rotações da Terra ao redor do Sol. Mas essa visão mecânica do tempo do relógio estreitou nossa percepção dos muitos tempos que existem, como referidos pelo Eclesiastes acima. Foram os cosmólogos modernos que nos despertaram para os vários tempos. Tudo no processo da evolução possui o seu timing. Não respeitando certo timing, tudo muda, e nós mesmos não estaríamos aqui para falar do tempo.
Assim, por exemplo, imediatamente após a primeira singularidade, o Big Bang, a explosão imensa (mas silenciosa, pois não havia ainda o espaço para recolher o estrondo) ocorreu a primeira expressão do tempo. Se a força gravitacional, aquela que faz expandir e ao mesmo tempo segurar as energias e as partículas originárias (a mais importante das quatro existentes) fosse por milionésimos de segundo mais forte do que se apresentou, retrairia tudo para si e causaria explosões sobre explosões e tornaria o universo impossível. Se fosse, por milionésima parte de segundo, um pouco mais forte, os gazes se expandiriam de tal forma que não ocasionariam a sua condensação e não teriam surgido as estrelas, os elementos todos que compõem o universo, nem haveria o Sol, a Terra e a nossa existência humana.
Mas ocorreu aquele tempo necessário para o equilíbrio entre a expansão e a contenção que acabou abrindo um tempo para surgir tudo o que veio posteriormente. Houve um exato tempo em que se formaram as grandes estrelas vermelhas, dentro das quais se forjaram todos os tijolinhos que compõem todos os seres. Se esse tempo exato fosse desperdiçado, nada mais teria acontecido.
Há pois tempos e tempos, e não apenas o tempo escravizante e mecânico do relógio. A Igreja guardou o sentido da diversidade dos tempos. Para cada tempo do ano, se Natal, se Quaresma ou Páscoa, há a sua cor específica.
Geralmente, vivemos os tempos das quatro estações com as transformações que ocorrem na natureza. Na nossa infância interiorana, os tempos eram bem definidos: janeiro-abril - tempo das uvas, dos figos, das melancias,dos melões; tempo de maio, o plantio do trigo; e outubro-novembro, tempo de sua colheita.
Estes tempos e outros conferiam distintos sentidos para a vida. Havia a espera do tempo, sua vivência e sua recordação.
O universo inteiro tem o seu tempo, que se concretiza em dois movimentos que se dão também em nós: nossos pulmões e nossos corações se expandem e se contraem. O mesmo faz o universo mediante a gravidade: ao mesmo tempo que se dilata ele é segurado, mantendo um equilíbrio sutil que faz tudo funcionar harmoniosamente. Quando perde esse equilíbrio, é sinal que prepara um salto para a frente e para cima rumo a uma nova ordem que também se expande e se contrai.
Cada um de nós tem seu tempo biológico, determinado não pelo relógio mecânico mas pelo equilíbrio de nossas energias. Quando chegam ao seu clímax, que pode ser com 10, 15, 50, 90 anos, se fecha o nosso ciclo e entramos no silêncio do mistério. Dizem que é aí que habita Deus, nos esperando com os braços abertos como um Pai e Mãe, cheio de saudades.
*Leonardo Boff é teólogo e escritor. - leonardo Boff
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