segunda-feira, 11 de outubro de 2010

"Pensavam que iam destruir papai", diz Ana Arraes


Ana Lúcia Arraes de Alencar (PSB) vive no limiar de duas gerações de políticos. Com o pai, o ex-governador Miguel Arraes, vivenciou e aprendeu o significado da política e do compromisso de um governante com o seu povo. Com o filho, o governador Eduardo Campos (PSB), tem a chance de ver o nome do seu pai sendo lançado para o futuro. Até 2006, ela nunca havia disputado nenhum cargo, e elegeu-se deputada federal.

Este ano, foi reeleita para o segundo mandato na condição de mais votada do Estado e a quinta do País, com 387.578 votos, numa campanha na qual o filho também sagrou-se como o mais votado proporcionalmente entre os governadores. Segundo Ana, a vitória de Eduardo foi política e eleitoral sobre o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB). “Não fizemos uma política mesquinha, nem pequena. Fizemos uma política com P maiúsculo”, assegura a socialista.

A senhora foi campeã de votos nessas eleições. Isso de certa forma lhe causou surpresa ou era algo de fato esperado?

Não. O número de votos a gente nunca sabe. Eu sabia que ia ter mais votos do que na primeira eleição (178.467), mas a dimensão total eu não sabia. Dessa vez eu fui votada em todos os municípios de Pernambuco. Apenas em 2006, eu não fui votada em Solidão, mas dessa vez tive votos em todos (risos). Alguns municípios eu não pude ir. É impossível com a distância que Pernambuco tem. Ainda não sei quantos municípios eu fui. Fiz uma média de sete municípios por dia. Eu devo ter sido uma das proporcionais que mais foi aos grandes eventos da majoritária junto com o governador Eduardo Campos, mas tinha agenda própria também.

O ex-governador Miguel Arraes, seu pai, e o governador Eduardo Campos, seu filho, são os maiores cabos eleitorais de toda essa sua história de sucesso nas urnas...

Encontrei um porteiro que disse que votou em mim. Ele disse: ‘Que esse povo do doutor Arraes é um povo muito bom’. É um caso concreto. Meu pai, graças a Deus, deixou essa grande herança política para a gente. Uma herança não só de o povo nos aplaudir e nos receber de uma forma diferente, mas também a herança do conhecimento, da realidade do Estado, essa coisa de ter lado, olhar o Estado como um todo. Isso nós aprendemos e estamos fazendo o dever de casa direitinho.

Em 1998, Arraes foi derrotado por Jarbas Vasconcelos com uma diferença de mais de um milhão de votos. Onde estava então o olhar dessa população para optar por uma mudança naquela época?

Essa diferença grande de votos, Pernambuco conhece como foi conquistada. Com calúnia e difamação que foram provadas ao longo do tempo. Não foi uma campanha limpa. Por isso, a gente não considera, mesmo porque uma coisa é uma derrota outra coisa é uma destruição. Pensavam que iam destruir papai porque estava velho. Temos uma sociedade que valoriza muito a juventude, que é uma coisa muito importante, mas os velhos têm um papel importante e a velhice não é defeito. A velhice é apenas uma condição daqueles que vivem mais. Pensavam que iam destruir a raiz. A campanha não foi só contra o governador Arraes, mas contra o seu neto também. A derrota para quem é derrotado significa renovação, esforço e trabalho. Não ficamos acuados.

Nesta eleição, o governador Eduardo Campos foi acusado de querer dizimar a oposição após ter implantado um processo de cooptação de prefeitos, o que lhe garantiu uma vitória esmagadora contra o grupo adversário...

Não fizemos uma política mesquinha, nem pequena. Fizemos uma política com P maiúsculo. Nós cuidamos do Estado todo, e o governador olhou Pernambuco sem discriminação às ações necessárias para os municípios. Pernambuco foi visto como um todo e a vitória representa a voz do povo, que reconheceu e percebeu que queria continuar. O resultado dos votos dizem isso. A campanha não teve nenhuma calúnia e nenhuma difamação. Aqueles prefeitos e outras lideranças de outros partidos que vieram nos apoiar, vieram porque o povo do seus municípios forçou para que viessem nos apoiar. Muitos dos quais tinham sido aliados antes. O povo do Interior queria que continuasse o governo. Como é que uma liderança fica, quando o seu povo quer votar naquilo que está dando certo? Ela vai apoiar o que está dando certo (risos).

Como a senhora acompanhou todas as acusações de Jarbas contra o governador durante a campanha? Uso da máquina, cooptações de prefeitos e transformar o Governo, partido e candidatura “nas mesmas coisas”.

Não me tocou. Quando uma coisa não tem respaldo na verdade, isso não me abala. Continuei a campanha sem falar mal de ninguém. Uma campanha pacífica de construção. Não busquei tomar conhecimento de forma mais aguda. Dizer é uma coisa muito fácil, provar é difícil. Fizemos uma campanha muito bonita, propositiva. Presença alegre nas ruas e com o povo acreditando na gente.

Essa vitória no Estado foi vista por muitos como uma vingança dos Arraes sobre o jarbismo. O que a senhora pensa sobre isso?

Não temos nenhuma tendência a trabalhar com vingança. Nunca carregamos vingança e ódio no coração, porque isso só traz mal a gente mes­mo. Isso foi uma bela vitória política. Foi uma aprovação de um projeto de governo que chegou na vida dos pernambucanos. Com um resultado político e eleitoral: maioria dos deputados federais, maioria dos estaduais, vitória dos dois senadores e do governador. Então foi uma vitória política e eleitoral. Trabalhamos buscando a unidade.

A senhora também foi acusada pelos opositores de se beneficiar na campanha pelo fato de ser a mãe do governador. Daí o apoio de tantos prefeitos ao seu nome.

Prefiro dizer que fui uma deputada federal, a terceira mais votada em 2006. Durante esse tempo de mandato, não me passei como a mãe do governador. Trabalhei para as minhas bases, dei presença e levei ação do Governo Federal, de verbas federais, tendo sensibilidade para ver e buscar em Brasília soluções para muita coisa. Se eu quisesse ter ficado de outro jeito, não teria trabalhado todos esses anos de domingo a domingo. Seria apenas a mãe do governador e ele iria me eleger. Sou uma mulher que gosta de trabalhar e acha que esse poder que o povo nos deu é para servir. Foi servindo que eu passei o meu mandato.

A imagem dos políticos e do Congresso continua desgastada junto à opinião pública. Eleger o humorista Tiririca (PR-SP), por exemplo, para a Câmara Federal seria uma resposta dos eleitores a esse cenário?

Não quero falar sobre Tiririca, né. A Câmara dos Deputados representa o povo brasileiro, se ela representa e chegamos lá votados pelo povo brasileiro, representa o povo brasileiro. A questão do Tiririca é da Justiça Eleitoral. O que dizem é o fato de ele não saber ler e aí fica difícil ser deputado assim.

Com uma votação expressiva em Pernambuco, evidentemente seu nome já fica cotado para qualquer disputa majoritária. Já passou pela sua cabeça entrar na briga por um cargo no Executivo em eleições futuras?

Acabei uma eleição, vou começar a exercer o meu mandato em fevereiro. Estou acabando agora esse mandato de 2006. A política é uma coisa muita dinâmica. O que me leva à Câmara com essa quantidade votos é a vontade de servir ao meu Estado e ao meu povo. Agradecer a generosidade e a confiança do pernambucano. Minha expectativa agora é honrar voto a voto fazendo ações e benefícios para a população e para o Estado.

O que os seus eleitores po­dem esperar do segundo mandado da deputada?

Na primeira vez, trouxemos a telefonia celular para 144 municípios. Foi uma luta minha conseguida na Comissão de Defesa do Consumidor junto com o Ministério das Telecomunicações e Anatel. Antes, só existiam 44 cidades em Pernambuco com telefonia móvel. Ainda neste mandato, já comecei a estudar a questão da banda larga. Espero que, no próximo mandato, consiga levar a banda larga para todos os municípios do interior. Ainda pretendo participar da reforma tributária. Ela é importantíssima e vou lutar para que ela saia e buscando com isso a justiça fiscal.

De início, todas as pesquisas indicavam uma vitória da presidenciável Dilma Rousseff no primeiro turno, mas isso mudou na reta final da campanha. Faltou mesmo humildade à campanha petista?

Faltou voto. E no final, as pesquisas já indicavam uma queda. Alguma coisa houve que fez com que nos levasse ao segundo turno. Acredito que agora a gente vai unir os esforços e a presidente (sic) terá mais tempo de se mostrar. Algumas campanhas (da oposição) foram feitas com determinados temas e a própria candidata já desmentiu pela televisão. Agora é vencer com a nossa unidade.

Temas polêmicos entraram em discussão no final do primeiro turno e ganham espaço nesse segundo. Isso também ajudou no adiamento da disputa eleitoral?

Eu sou católica. Sou contra o aborto. Não posso dizer que Deus é menor do que eu. Um País onde temos muita liberdade de religião, não se pode afrontar Deus e nem a vida. Toda essa questão precisa ser esclarecida. O presidente Lula era o risco do Brasil e hoje colocou o País no cenário internacional como um dos países mais importantes do mundo. Uma política externa vitoriosa.

A senhora apontaria alguma área onde o Governo Lula não acertou?

Existe um deficit histórico em relação ao povo brasileiro. O Brasil, que era de poucos e para poucos, passou a ser de todos e para todos. Erros sempre existem, mas é muito mais fácil apontar erros do que acertos. Prefiro apontar os acertos porque foram aprovados por muita gente. Esse Brasil de todos e para todos é um Brasil que vai dar certo.

Dilma está preparada para governar o Brasil?

Acredito que a presidente (sic) Dilma é preparada para governar o Brasil. Tem compromissos com a sua história e lutou por um Brasil democrático. Acredito que agora pegando esse governo do presidente Lula ela irá levar o Brasil à frente e para todos.

Depois de sair das urnas como o candidato a governador mais votado do Brasil (82,84% dos votos), Eduardo Campos estaria credenciado para uma disputa presidencial em 2014?

O que ocorreu com a eleição de Pernambuco concretiza o fato de que o nosso governador é uma liderança do Nordeste e uma jovem liderança do Brasil. Uma nova turma de políticos, e ele tem status nacional. Ele está credenciado para discutir os grandes desafios políticos com a sua experiência e seu talento político. Apesar de ser muito novo, tem mais de 20 anos de política, e com sua forma de saber agregar desponta no cenário nacional como uma liderança que tem um peso nacionalmente e no Nordeste. Com essa eleição, o PSB aumentou o número de governadores, senadores e deputados estaduais e federais e com chances de aumentar o número de governadores neste segundo turno.

O presidente Lula ajudou bastante o governador Eduardo...

Não posso negar que Lula ajudou muito. Diferentemente de outros presidentes que só perseguiram. O presidente Lula não só ajudou Pernambuco, ele ajudou todos os estados brasileiros, inclusive a antiga gestão aqui em Pernambuco. Então isso não é pelos lindos olhos de Eduardo, que são lindos mesmo. Mas é pela competência do governador de fazer o projeto, ter a eficiência da máquina... Não é só porque se é amigo do rei que tem as horas do rei. Lula é um grande homem porque não fez uma política de perseguição. Quem não é aliado não recebe recursos? Isso é uma política antiga e que foi derrotada nesta eleição. Por isso digo que essa vitória foi política e eleitoral.

Independentemente do tempo e da geração política, o que tem de semelhante entre Miguel Arraes e Eduardo Campos?

Não gosto de fazer comparações, mas cito o meu querido amigo (escritor) Ariano Suassuna: ‘Eduardo é o Arraes novo’. Ele aprendeu muito, tem o grande talento de ter aprendido com os mais velhos e de buscar soluções novas. Mas tudo com o lastro político que ele aprendeu com o seu avô e também com o presidente Lula. (de olhos marejados) Tenho certeza que papai está muito feliz com ele lá em cima. Tenho a felicidade de ter tido um pai que nos guiou e teve um grande compromisso com o seu Estado e de ter um filho que honra a sua história e lança o seu nome para a frente. Admiro a sua forma de trabalhar, a constante curiosidade de aprender mais, estudar mais e tornar mais eficiente as coisas. Ele sabe conduzir ações públicas com competência. Meus filhos foram criados com o ensinamento que o trabalho dignifica o homem e a sociedade.

Entrevista exclusiva à Folha de Pernambuco

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