Em nome do pluralismo na imprensa, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) fez um apelo nesta quinta-feira (7) ao diretor de Redação do jornal O Estado de S. Paulo, Rui Mesquita: pediu que aquele órgão de imprensa reverta a demissão da psicanalista Maria Rita Kehl do seu quadro de colaboradores. Ela foi dispensada depois da publicação, em 2 de outubro, do artigo intitulado "Dois pesos ...", no qual tece elogios aos avanços sociais propiciados pelo governo Lula.
A psicanalista alega ter sofrido censura, o que provocou um intenso debate na internet. Para Suplicy, que leu o artigo durante seu pronunciamento, o texto "ensejou a decisão do jornal", defensor assumido da candidatura de José Serra à Presidência da República.
Segundo Suplicy, após sua demissão Maria Rita Kehl fez questão de elogiar a postura do jornal, ao mostrar claramente sua preferência entre os candidatos, mas argumentou que isso não deveria impedir O Estado de S. Paulo de abrigar em suas páginas opinião divergente.
Ela também disse considerar contraditória a atitude da empresa, que destaca em sua primeira página a censura a que estaria submetida por não poder publicar matérias sobre investigação judicial a respeito da família Sarney. A vedação decorre de decisão da Justiça.
Bolsa-família
Um dos pontos fundamentais do artigo da psicanalistaé sua contrariedade em relação ao que chamou de desqualificação do voto dos mais brasileiros mais humildes. Conforme opiniões que ela colheu na internet, cidadãos urbanos bem situados tenderiam a achar que os beneficiados por programas como o bolsa-família votariam emDilma Roussef para continuar em situação cômoda.
"Se o povão das chamadas classes D e E - os que vivem nos grotões perdidos do interior do Brasil - tivesse acesso à internet, talvez se revoltasse contra as inúmeras correntes de mensagens que desqualificam seus votos. O argumento já é familiar ao leitor: os votos dos pobres a favor da continuidade das políticas sociais implantadas durante oito anos de governo Lula não valem tanto quanto os nossos. Não são expressão consciente de vontade política. Teriam sido comprados ao preço do que parte da oposição chama de bolsa-esmola", afirma a psicanalista em sua análise.
Correntes
Maria Rita disse ter recebido um e-mail contendo uma das correntes que embasaram o seu argumento. Segundo ela, a corrente reproduzia a denúncia feita por uma mulher, residente em Fortaleza, que se diz indignada com a indolência dos trabalhadores não qualificados de sua cidade e se queixa de que ninguém mais queria trabalhar como porteiro do prédio onde mora, pois preferiam viver "na moleza" com o dinheiro do Bolsa-Família.
Em seguida, a articulista assinala, no texto, o fato de ninguém questionar o valor do salário oferecido pelo condomínio para o cargo de porteiro, pois o valor máximo da soma de todos os benefícios pagos pelo governo para quem tem mais de três filhos mantidos na escola, é de R$ 200. Ela também citou outra "denúncia indignada" sobre uma cidade no interior do Piauí onde todos os habitantes estariam vivendo exclusivamente do dinheiro dos programas do governo.
"Se for verdade, é estarrecedor imaginar do que viviam antes disso. Passava-se fome, na certa, como no assustador Garapa, filme de José Padilha. Passava-se fome todos os dias. Continuam pobres as famílias abaixo da classe C que hoje recebem a bolsa, somada ao dinheirinho de alguma aposentadoria. Só que agora comem. Alguns já conseguem até produzir e vender para outros que também começaram a comprar o que comer", comparou Maria Rita Kehl em seu texto.
A articulista conclui citando o economista Paul Singer, para quem "o voto da turma da 'esmolinha' é político e revela consciência de classe recém-adquirida. Ela afirma que o Brasil mudou nesse ponto e para melhor, pois hoje não é tão fácil encontrar quem aceite trabalhar por um salário menor que o mínimo.
'Delito de opinião'
Suplicy também leu a entrevista que a psicanalista concedeu ao jornalista Bob Fernandes da Terra Magazine. Nessa entrevista, ela afirmou que foi demitida pelo que o jornal considerou "um delito de opinião". Segundo ela, o jornal argumentou que a repercussão gerada pelo artigo na internet tornou a sua situação insustentável.
O senador ainda leu a entrevista concedida pelo diretor de conteúdo do Grupo O Estado de S. Paulo, Ricardo Gandour, à Terra Magazine. Nessa entrevista, o diretor explicou que o projeto original do caderno C2 + Música é de ter, aos sábados, um espaço em torno da psicanálise, "um divã para os leitores", mas a articulista Maria Rita Kehl não estava praticando este enfoque na coluna.
Ricardo afirmou que a editora do caderno conversava frequentemente com a psicanalista sobre o problema e que não houve censura, lembrando que o artigo foi publicado na íntegra, "sem mexer em uma vírgula". Segundo ele, nessas conversas foram discutidos novos rumos para a coluna, inclusive com o contrapropor da articulista. Mas, após a última conversa, houve um vazamento na internet que precipitou a decisão de demiti-la e ele lamentou que estivesse havendo uma "leitura histérica disso".
O diretor também disse que a demissão de Maria Rita não foi motivada pelo artigo em questão, mas o foco que se pretendia para o espaço da coluna e que não estava sendo atendido. Ele observou que, num jornal, os colunistas se revezam e/ou são substituídos após cumprirem ciclos.
"A Chris Mello saiu do jornal em agosto, o Mark Margolis entrou em outra seção. O jornal tem 92 colunistas. Esse ano saíram três e entraram três ou quatro. O que estava havendo aí é a simples gestão de uma coluna específica. O momento é delicado, crítico, de eleições. Mas, abriu-se uma diálogo que vazou e nós mantivemos a linha", afirmou o diretor do jornal.
Suplicy concluiu sua "análise sobre o tema" lendo um artigo do jornalista e professor da Universidade de São Paulo (USP), Eugênio Bucci, intitulado "O valor do pluralismo", igualmente publicado pelo jornal O Estado de São Paulo, nesta quinta-feira (7). No artigo, Bucci pergunta se a imprensa brasileira "está à altura dos desafios que pesam sobre a nossa democracia". Para ele, a resposta será mais ou menos positiva quanto mais ou menos cada redação cultivar o valor do pluralismo, pois sem ele não há democracia.
"Mesmo dentro do seu corte, da sua escolha editorial, um órgão de imprensa há de saber que sua credibilidade decorre justamente do respeito que reserva às opiniões divergentes. Uma opinião que precisa silenciar outra para se afirmar, corrói a si mesma", argumenta Bucci, de acordo com a citação de Suplicy.
A psicanalista alega ter sofrido censura, o que provocou um intenso debate na internet. Para Suplicy, que leu o artigo durante seu pronunciamento, o texto "ensejou a decisão do jornal", defensor assumido da candidatura de José Serra à Presidência da República.
Segundo Suplicy, após sua demissão Maria Rita Kehl fez questão de elogiar a postura do jornal, ao mostrar claramente sua preferência entre os candidatos, mas argumentou que isso não deveria impedir O Estado de S. Paulo de abrigar em suas páginas opinião divergente.
Ela também disse considerar contraditória a atitude da empresa, que destaca em sua primeira página a censura a que estaria submetida por não poder publicar matérias sobre investigação judicial a respeito da família Sarney. A vedação decorre de decisão da Justiça.
Bolsa-família
Um dos pontos fundamentais do artigo da psicanalistaé sua contrariedade em relação ao que chamou de desqualificação do voto dos mais brasileiros mais humildes. Conforme opiniões que ela colheu na internet, cidadãos urbanos bem situados tenderiam a achar que os beneficiados por programas como o bolsa-família votariam emDilma Roussef para continuar em situação cômoda.
"Se o povão das chamadas classes D e E - os que vivem nos grotões perdidos do interior do Brasil - tivesse acesso à internet, talvez se revoltasse contra as inúmeras correntes de mensagens que desqualificam seus votos. O argumento já é familiar ao leitor: os votos dos pobres a favor da continuidade das políticas sociais implantadas durante oito anos de governo Lula não valem tanto quanto os nossos. Não são expressão consciente de vontade política. Teriam sido comprados ao preço do que parte da oposição chama de bolsa-esmola", afirma a psicanalista em sua análise.
Correntes
Maria Rita disse ter recebido um e-mail contendo uma das correntes que embasaram o seu argumento. Segundo ela, a corrente reproduzia a denúncia feita por uma mulher, residente em Fortaleza, que se diz indignada com a indolência dos trabalhadores não qualificados de sua cidade e se queixa de que ninguém mais queria trabalhar como porteiro do prédio onde mora, pois preferiam viver "na moleza" com o dinheiro do Bolsa-Família.
Em seguida, a articulista assinala, no texto, o fato de ninguém questionar o valor do salário oferecido pelo condomínio para o cargo de porteiro, pois o valor máximo da soma de todos os benefícios pagos pelo governo para quem tem mais de três filhos mantidos na escola, é de R$ 200. Ela também citou outra "denúncia indignada" sobre uma cidade no interior do Piauí onde todos os habitantes estariam vivendo exclusivamente do dinheiro dos programas do governo.
"Se for verdade, é estarrecedor imaginar do que viviam antes disso. Passava-se fome, na certa, como no assustador Garapa, filme de José Padilha. Passava-se fome todos os dias. Continuam pobres as famílias abaixo da classe C que hoje recebem a bolsa, somada ao dinheirinho de alguma aposentadoria. Só que agora comem. Alguns já conseguem até produzir e vender para outros que também começaram a comprar o que comer", comparou Maria Rita Kehl em seu texto.
A articulista conclui citando o economista Paul Singer, para quem "o voto da turma da 'esmolinha' é político e revela consciência de classe recém-adquirida. Ela afirma que o Brasil mudou nesse ponto e para melhor, pois hoje não é tão fácil encontrar quem aceite trabalhar por um salário menor que o mínimo.
'Delito de opinião'
Suplicy também leu a entrevista que a psicanalista concedeu ao jornalista Bob Fernandes da Terra Magazine. Nessa entrevista, ela afirmou que foi demitida pelo que o jornal considerou "um delito de opinião". Segundo ela, o jornal argumentou que a repercussão gerada pelo artigo na internet tornou a sua situação insustentável.
O senador ainda leu a entrevista concedida pelo diretor de conteúdo do Grupo O Estado de S. Paulo, Ricardo Gandour, à Terra Magazine. Nessa entrevista, o diretor explicou que o projeto original do caderno C2 + Música é de ter, aos sábados, um espaço em torno da psicanálise, "um divã para os leitores", mas a articulista Maria Rita Kehl não estava praticando este enfoque na coluna.
Ricardo afirmou que a editora do caderno conversava frequentemente com a psicanalista sobre o problema e que não houve censura, lembrando que o artigo foi publicado na íntegra, "sem mexer em uma vírgula". Segundo ele, nessas conversas foram discutidos novos rumos para a coluna, inclusive com o contrapropor da articulista. Mas, após a última conversa, houve um vazamento na internet que precipitou a decisão de demiti-la e ele lamentou que estivesse havendo uma "leitura histérica disso".
O diretor também disse que a demissão de Maria Rita não foi motivada pelo artigo em questão, mas o foco que se pretendia para o espaço da coluna e que não estava sendo atendido. Ele observou que, num jornal, os colunistas se revezam e/ou são substituídos após cumprirem ciclos.
"A Chris Mello saiu do jornal em agosto, o Mark Margolis entrou em outra seção. O jornal tem 92 colunistas. Esse ano saíram três e entraram três ou quatro. O que estava havendo aí é a simples gestão de uma coluna específica. O momento é delicado, crítico, de eleições. Mas, abriu-se uma diálogo que vazou e nós mantivemos a linha", afirmou o diretor do jornal.
Suplicy concluiu sua "análise sobre o tema" lendo um artigo do jornalista e professor da Universidade de São Paulo (USP), Eugênio Bucci, intitulado "O valor do pluralismo", igualmente publicado pelo jornal O Estado de São Paulo, nesta quinta-feira (7). No artigo, Bucci pergunta se a imprensa brasileira "está à altura dos desafios que pesam sobre a nossa democracia". Para ele, a resposta será mais ou menos positiva quanto mais ou menos cada redação cultivar o valor do pluralismo, pois sem ele não há democracia.
"Mesmo dentro do seu corte, da sua escolha editorial, um órgão de imprensa há de saber que sua credibilidade decorre justamente do respeito que reserva às opiniões divergentes. Uma opinião que precisa silenciar outra para se afirmar, corrói a si mesma", argumenta Bucci, de acordo com a citação de Suplicy.
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