domingo, 4 de julho de 2010

Ficar "de boca calada" é bom conselho, Dra. Cureau?

Do Tijolaço por Brizola Neto

Ontem, disse aqui que ia solicitar à Presidência da Câmara dos Deputados providências para evitar que ocorra com a TV Câmara o que está acontecendo com a TV Senado, que está sendo representada na Justiça Eleitoral pelo fato de dois senadores, no uso da tribuna parlamentar, terem feito o que a vice-procuradora eleitoral, Dra. Sandra Cureau, chamou de “apologia de José Serra”. Sou, como é óbvio, o que mais distante pode haver de uma apologista de Serra. Mas não aceito que, num estado democrático, um parlamentar seja cerceado em seu direito de livre manifestação na tribuna do Senado ou da Câmara. E do caráter público – que a transmissão pelas TVs Câmara e Senado fazem ser real, num país de 8,5 milhões de km²e quase 200 milhões de habitantes.

Hoje, porém, estou ainda mais estarrecido. Leio no Estadão uma entrevista da Dra. Sandra Cureau se refere ao Presidente da Republica em termos absolutamente inadequados para sua alta e , ao menos desejável, imparcial posição. Diz que o problema é que o presidente Lula é que “não consegue ficar de boca calada”.

Vou reproduzir o trecho, para que não se diga que eu retiro as palavras do contexto em que a colocou a repórter carioca Marta Salomon:

“Sandra Cureau – ela costuma escrever “Quirrô” para os que têm dificuldade de pronunciar o sobrenome francês – é personagem nas multas já aplicadas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva por propaganda antecipada. “Não sou eu quem multa, ele é que não consegue ficar com a boca calada”, justifica a subprocuradora.”

Salvo melhor juízo, acho que não é correto sugerir que uma autoridade pública fique “de boca calada”, menos ainda o presidente da República. Eu, por exemplo, acho desaconselhável que uma procuradora envolvida numa intensa disputa presidencial dê entrevista com declarações deste teor. Nem por isso, por respeito à sua função institucional e até por educação, não sugeriria que ela “não consegue ficar de boca calada”.

Divirja eu quanto divergir da orientação que ela imprime ao MPE, não tenho o direito de me expressar assim, e não devo cometer desrespeitos ou agressões pessoais, embora tenha todo o direito de criticar seus atos e omissões e, até, de pedir ações jurídicas contra eles.

Mas a Dra. Sandra não pára por aí. Diz que está “deixando passar”, por não dispor de estrutura de pessoal, coisas menores, para concentrar-se nas grandes.

De novo, transcrevo, literalmente:

“Se for uma coisa pequena, que não seja relevante, deixo passar, não vou entupir o tribunal com bobagens”, resume. “Vai ser uma eleição muito, muito, muito complicada”, diz a xerife do pleito: “O termo não é muito simpático, mas, na verdade, é isso mesmo: xerife”.

Mesmo com boa-vontade para relevar esta assunção do termo xerife em lugar de fiscal da lei para o MPE, gostaria de saber o que é relevante para a procuradora. Passadas várias semanas, não há representação ajuizada pela Dra. Sandra, ao menos de que se tenha notícia, contra a utilização – deliberada, planejada e publicada em todos os jornais – de uso flagrantemente irregular de redes nacionais de televisão do PPS e do PTB. Neste período, porém, houve tempo e condições de investir contra pequenos blogs na internet, de relevãncia milionesimamente menor.

A subprocuradora Cureau, que não hesita em sugerir que o presidente da República fique de boca calada, certamente não teve ensejo, na sua longa entrevista, de comentar sequer estes abusos contumazes, embora não entenda eu por que o uso irregular de redes nacionais de rádio e televisão, com dezenas de milhões de espectadores seja “bobagem” e fique, se ficar, para o final da fila, para não entupir o tribunal porque, talvez, “não seja relevante”.

Não bastasse, porém, a sua longa entrevista ao Estadão, a Dra. Cureau lança outra declaração insólita, desta vez na Folha de S. Paulo (edição para assinantes). Falando ao jornal – de novo a citação é literal – ele diz que “a oposição foi estimulada a fazer propaganda depois dos programas do PT com Dilma em maio. “Foi o divisor de águas. A partir dali a gente não teve mais controle”, afirmou.

Ah, então é assim. Se houve uma transgressão – de avaliação subjetiva – de um dos lados o outro estaria autorizado a fazer até mesmo transgressões flagrantemente objetivas ao texto da lei? Faz muito tempo, desde a infância, que não ouco o argumento “jurídico” do “ah, mas foi ele quem começou” como razão para justificar uma transgressão. E, mesmo quando era usado, o castigo era para os dois.
Este post não está aberto a comentários. Mesmo que me seja impensável haver sentimentos mesquinhos de vingança por parte de qualquer pessoa investida de funções tão altas, hoje em dia é bom pensar no impensável.

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